O Supremo Tribunal Federal (STF) está a um passo de transformar o acesso a medicamentos não incorporados ao SUS em uma batalha ainda mais difícil para pacientes com doenças raras e graves, que já enfrentam um sistema público de saúde sobrecarregado.
A decisão iminente dos Temas 6 e 1234 promete trazer mudanças profundas, criando barreiras adicionais que poderão comprometer a saúde de milhares de pessoas que dependem de tratamentos de altíssimo custo para sobreviver. Essa decisão impactará as pessoas que precisam e precisarão buscar, pela via judicial, medicamentos não incorporados ao Sistema Único de Saúde, ou seja, aqueles que o SUS não oferece.
Os Ministros Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso proferiram um voto em conjunto, que já recebeu apoio dos demais ministros, formando a maioria necessária para a aprovação das novas regras que dificultam e limitam o acesso a esses medicamentos que não estão na lista do SUS.
Ao criar regras mais rígidas e exigir que o paciente prove que o Poder Público errou e agiu de forma ilegal ao negar o medicamento, que o medicamento é seguro e eficaz com base em evidências científicas específicas, e que o caso passe por análise de órgãos técnicos, o STF impõe um processo judicial complexo e demorado, o que pode ser prejudicial para pacientes em situações mais críticas de saúde.
Embora os Ministros aleguem que as mudanças buscariam a proteção do orçamento público para uma suposta garantia do funcionamento do SUS, a decisão acaba por desconsiderar pacientes que não possuem alternativas de tratamentos.
Pacientes acometidos com doenças raras ou doenças graves, por exemplo, tendem a necessitar de tratamentos de altíssimo custo. Pela raridade e complexidade da doença, os estudos em relação aos medicamentos são poucos, apesar de, na prática, demonstrarem plena efetividade para controle da enfermidade. Nesse sentido, o STF caminha para uma decisão que desconsidera as especificidades de cada caso.
O voto dos Ministros também desconsidera que os problemas de orçamento do SUS não são causados pela judicialização para obtenção de medicamentos, mas sim por fatores como má gestão, má alocação de recursos e a intensa falta de investimentos adequados na saúde pública, ignorando que a verdadeira raiz das dificuldades financeiras do SUS está em uma administração ineficiente e em políticas públicas que não priorizam a aplicação correta e justa dos recursos.
Embora haja a limitação de direitos e a inserção de novas barreiras adicionais para o acesso aos medicamentos não incorporados ao SUS, a decisão não inviabiliza a possibilidade de judicialização. O desafio de provar erros administrativos, a segurança do medicamento e passar por análises técnicas rigorosas cria um cenário ainda mais desafiador para quem luta contra o tempo.
Com a nova decisão, pacientes ainda poderão buscar o fornecimento de medicamentos por via judicial, apenas precisarão cumprir requisitos mais rigorosos. Isso significa que o acesso a esses medicamentos pode se tornar mais lento, mas, ainda assim, é possível ir em busca do fornecimento do medicamento pelo SUS.
Mesmo havendo novos obstáculos, o direito à saúde permanece como um dever do Estado, e a justiça pode, com o devido suporte jurídico, continuar sendo uma via de esperança para muitos.
(*) Ludmila Ferraz é advogada, especialista em direito da saúde, direito médico e em direito regulatório, Membro Efetivo da Comissão de de Saúde da OAB-MT
Foto-Arquivo