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A realidade dos indaiatubanos que fazem hemodiálise em outras cidades

HUGO ANTONELI JUNIOR

Quatro vezes por semana Maria* acorda cedo tomando cuidado para não se atrasar. Sem falta, às 8 horas, a van passa, ela embarca e só retorna por volta das 16 horas. O transporte não é para o trabalho que ela tanto deseja, nem para estudos, mas para tratamento de saúde em outra cidade. Ela mora em Indaiatuba (SP), mas faz hemodiálise em Sumaré (SP), que fica a cerca de 100 quilômetros de casa. Além dos transtornos de um tratamento desgastante, a indaiatubana reclama das condições das vans, dos atrasos e do descaso dos políticos locais com a situação. “Acho uma falta de respeito absurda. Eu moro aqui, tinha que fazer o tratamento aqui”, relata. Enquanto estava internada no hospital de Indaiatuba ela fazia o tratamento no local, conforme relata ao Comando Notícia. “Quando arrumaram uma vaga, tive alta e passei a fazer o tratamento em outra cidade.”

Maria* vai para Sumaré acompanhada de pelo menos seis pessoas três vezes por semana. Na outra vez ela vai com mais 14 pessoas, segundo relata. A luta pela sobrevivência na saúde também se reflete na busca por um emprego. “Como que eu vou trabalhar com este horário? Se eu fizesse o tratamento aqui até daria para ir atrás de algo, mas saindo de casa às 8 horas e voltando às 16 horas fica inviável até de trabalhar. Como a gente vai conseguir sobreviver?”, revolta-se. “Algumas pessoas que fazem o tratamento conseguem o auxílio doença pelo INSS, eu tentei, mas você sabe como é o nosso país. Não sei o que fazer.”

Os riscos também são uma preocupação. “Estes dias um paciente saiu daqui passando mal, chegou lá em Sumaré não tinha mais o que fazer, ele morreu”, conta. “A gente pediu vans melhores, porque a gente vai em um calor insuportável. Todos que estão ali em tratamento vão e voltam ou com pressão alta, ou com pressão baixa por causa da temperatura. E a gente sabe que tem vans com ar condicionado. Eu não sou melhor do que ninguém, só estou lutando para que todos os pacientes tenham um tratamento adequado”, relata. O pedido por um profissional de enfermagem para acompanhar os pacientes foi feito a dois vereadores. “Eles disseram que isso causaria custos aos cofres da cidade e que ficaria impossível de eles fazerem algo.”

Ela se revolta por não poder se tratar na cidade onde mora. “Em Sumaré somos bem atendidos? Somos. É muito bom, não tenho o que reclamar. Só que eu não moro em Sumaré, eu não voto em Sumaré, eu voto para prefeito e para vereador em Indaiatuba. Sou uma cidadã indaiatubana. E aí temos que pegar a estrada, correr todos os riscos e ir para outra cidade todo dia?”, questiona. Durante algumas semanas houve inclusive atraso na volta. “O motorista das quintas-feiras só chegava para nos buscar depois das 19 horas, sendo que a clínica onde fazemos o tratamento fecha às 17h30. Ficávamos na rua esperando, inclusive se chovesse”, informa. Segundo relata, os atrasos eram porque o motorista dizia que não era daquela área, só estava cobrindo outro profissional. Estes atrasos especificamente cessaram nas últimas semanas.

Resposta

O Comando Notícia enviou um questionamento à Secretaria da Saúde, através da assessoria de imprensa, no dia 1º de novembro, mas não houve retorno. Entramos então, com base na lei de acesso à informação, com um protocolo pedindo informações sobre a hemodiálise na cidade. O protocolo foi respondido no dia 14 de novembro. A Prefeitura informou que, ao todo, 28 pacientes fazem tratamento fora da cidade e que para isso são usadas quatro vans.

A secretaria não soube informar quantos funcionários são designados para a função porque “a Central de Ambulância conta com 40 funcionários distribuídos em diversos serviços (…) não temos como informar quantos são utilizados para este atendimento específico”. A Prefeitura ainda disse que os pacientes fazem tratamento em três cidades diferentes, Campinas (SP), Sumaré (SP) e a capital, São Paulo.

Há seis linhas fixas saindo de Indaiatuba semanalmente, ainda segundo o protocolo da lei de acesso à informação. A Prefeitura, porém, não informou quantas vagas para o tratamento da hemodiálise há na cidade e nem se há previsão de abertura de outras vagas. “As vagas são regulamentadas pela Secretaria de Saúde do Estado.”

O que é hemodiálise

Hemodiálise é o procedimento através do qual uma máquina filtra e limpa o sangue, fazendo parte do trabalho que o rim doente não pode fazer. O procedimento retira do corpo os resíduos prejudiciais à saúde, como o excesso de sal e de líquidos. Também controla a pressão arterial e ajuda o organismo a manter o equilíbrio de substâncias como sódio, potássio, ureia e creatinina.

A hemodiálise está indicada para pacientes com insuficiência renal aguda ou crônica graves. A indicação de iniciar esse tratamento é feita pelo médico especialista em doenças dos rins (nefrologista). É possível começar o tratamento para insuficiência renal com medicamentos que controlam os sintomas e estabilizam a doença. Nos casos em que os remédios não são suficientes e a doença progride, pode ser necessário iniciar a hemodiálise. Esta decisão é tomada em conjunto com o paciente e o seu médico nefrologista. A diálise não tem como objetivo tratar a doença renal, mas sim, substituir a função dos rins que estão com seu funcionamento prejudicado.

*Maria é um nome fictício para proteger a identidade da entrevistada.

foto: divulgação/arquivo