Cachaça: o destilado brasileiro que enfrentou proibições e virou símbolo nacional – Comando Notícia
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Cachaça: o destilado brasileiro que enfrentou proibições e virou símbolo nacional

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Produzida desde o século XVII, a cachaça atravessou disputas comerciais, revoltas populares e conquistou reconhecimento oficial como patrimônio da cultura brasileira.

Pioneira na América

A cachaça é considerada o primeiro destilado da América Latina, anterior à tequila mexicana, ao pisco peruano e ao rum caribenho. Embora tenha esse reconhecimento histórico, descobertas recentes indicam que o processo de destilação de álcool já era conhecido no México muito antes da chegada dos colonizadores europeus — o que pode reconfigurar parte dessa narrativa.

Origem colonial

Quando se fala em cachaça, muitos brasileiros logo lembram da frase popularizada pela música: “É a marvada da pinga que me atrapalha.” Mais do que uma bebida, a cachaça carrega séculos de história, cultura e resistência.

Ela surgiu no século XVII, entre os anos de 1516 e 1532, em engenhos localizados no litoral entre São Paulo e Pernambuco. Com a produção de cana-de-açúcar já estabelecida, a cachaça nasceu como subproduto das lavouras e rapidamente se tornou tão valiosa quanto o próprio açúcar.

Registros do Engenho do Conde, na Bahia — conhecido como a “Rainha do Recôncavo” — mencionam despesas com aguardente destinada aos negros escravizados, evidenciando sua circulação precoce.

Moeda de troca e expansão

Antes da circulação de dinheiro em papel, a cachaça era usada como moeda de troca. Era enviada à África, junto com o tabaco, para pagar pela compra de escravizados. Ao chegarem ao Brasil, esses indivíduos eram trocados por metais preciosos, o que ajudava a reduzir os custos de navegação no século XVII e consolidava a aguardente como ativo estratégico na economia colonial.

O comércio da bebida foi impulsionado por mercadores que souberam promover seu valor. Primeiro com o vinho português, a bagaceira, e depois com a cachaça, mais barata e abundante. Povos indígenas já produziam o cauim — bebida fermentada feita com mandioca mastigada — e africanos consumiam vinho de caldo de palma. Mas o teor alcoólico da cachaça rapidamente conquistou espaço.

Conflitos e proibições

A popularidade da cachaça gerou tensão com a Coroa Portuguesa. De um lado, ela era fonte de renda e garantia a manutenção da mão de obra escrava. Do outro, ameaçava o comércio da bagaceira portuguesa, gerando reclamações entre colonos ligados à metrópole.

Em 13 de setembro de 1649, o rei Dom João IV assinou uma carta proibindo oficialmente a fabricação da cachaça no Brasil. A medida visava proteger os interesses comerciais portugueses, mas gerou instabilidade.

No Rio de Janeiro, a proibição afetou diretamente a economia local. Após debates na Câmara, em 1660, legisladores conseguiram liberar a produção da bebida, mediante aumento de impostos. O governador voltou atrás, e no dia seguinte estourou a Revolta da Cachaça — um levante que simbolizou a resistência dos produtores locais frente às imposições da metrópole.

Reconhecimento oficial

Séculos depois, a data de 13 de setembro ganhou novo significado. Em 2009, o Instituto Brasileiro da Cachaça (IBRAC) instituiu oficialmente o Dia da Cachaça, em homenagem à trajetória da bebida e à luta de seus produtores ao longo do tempo.

Do engenho à celebração, ela resistiu, evoluiu e conquistou seu lugar.

Com informação: Mapa da Cachaça