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Crítica: “Era uma vez… em Hollywood” é um dos mais divertidos de Tarantino

Quentin Tarantino entre seus astros Brad Pitt e Leonardo Di Caprio.

MARCOS KIMURA*

Antes de mais nada, já vou avisando: “Era uma vez em… Hollywood é um dos filmes mais divertidos de Quentin Tarantino, mas para entrar no clima você precisa ter uma referência principal, que é o assassinato da atriz Sharon Tate pelos seguidores de Charles Manson. Para os americanos, é algo que já faz parte da mitologia do país, mas, para muitos brasileiros, o episódio talvez seja desconhecido.

Dito isso, vamos às considerações, sem spoilers. O filme começa com o astro de TV decadente Rick Dalton (Leonardo Di Caprio, já candidatíssimo ao Oscar de novo) e seu dublê e faz-tudo, Cliff Booth (Brad Pitt, também excelente) encontrando com um agente poderoso da indústria, Marvin Shwarz (Al Pacino fazendo o que faz há anos, ser Al Pacino).

Este aponta os sinais de que sua carreira está num impasse e o aconselha ir para a Itália fazer westerns spaghetti. Os cinéfilos já ficam atentos, porque o título se refere a “Era uma vez no Oeste”, de Sergio Leone. Só que o Sergio que Shwarz tem em mente é outro, Corbucci, autor de “Django”, e chamado por ele de “segundo melhor diretor de faroeste italiano”, coisa com a qual Pedro de Queiroz não concordaria, e certamente nem Tarantino.

Paralelamente, vemos a rotina de estrela da moda de Sharon Tate (vivida de forma luminosa por Margot Robbie), em festas à bordo de aviões e na mansão Playboy, convivendo com as cantoras do The Mamas & The Papas e com o superastro Steve McQueen (Damien Lewis), que, e forma hilária, confessa ter uma queda por Sharon. Saber seu destino dá um tom meio Titanic às suas aparições em cena (a sequência no cinema é a melhor, tanto pela chance de ver a verdadeira Sharon Tate em ação, quanto como um comentário irônico à atual indústria das celebridades)

Enquanto isso, Dalton e Booth percorrem a cidade atrás de trabalho. Após entrar para lista negra das redes de TV ao abandonar sua série de sucesso para tentar carreira no cinema, Dalton faz vilões convidados em diversos seriados. Mas o modo como leva a sério o ofício origina algumas das melhores cenas do filme (a participação da atriz mirim é antológica). Já, Booth, não encontra mais trabalho por causa de um episódio envolvendo Bruce Lee que é sensacional, gerou protestos da filha do astro chinês, mas é importante para a trama, e conta com a participação de Kurt Russell, num contraste com o dublê misógino e assassino de “À prova de morte”, agora é um marido “sim, bem”

De modo geral, Tarantino homenageia a mão de obra da indústria, atores e dubles. Tanto o decadente Dalton quanto a ascendente Sharon vivem em busca de aprovação de suas atuações. Interessante a escalação de Timothy Olyphant no papel do astro de “Lancer”, James Stacey (seriado e ator reais), já que ele mesmo ficou famoso na última grande série de faroeste na TV, “Deadwood”, e como um xerife pistoleiro moderno em “Justified”.

Dentre tantas referências de western, Booth é o verdadeiro caubói solitário, satisfeito em ser a sombra do amigo e patrão, morando num trailer com seu cão, mas tendo seu próprio código de conduta, não importa as tentações ou perigos envolvidos. E quando tira a camisa é para humilhar os outros machos, do alto de seus 55 anos…

As marcas registradas de Tarantino estão todas ali, pés femininos descalços em close, os cigarros Red Apple (atenção, tem cena pós-créditos), mas a violência gráfica fica reservada para o final. Resumindo em duas palavras, “Bastardos Inglórios”. Há quem diga que ele acaba fazendo piada com o que não devia. Besteira, o que ele faz é uma declaração de amor. Aos atores e ao cinema. Confira a programação de horários.

*Marcos Kimura é jornalista, curador do Cineclube Indaiatuba (SP) e escreve sobre cinema semanalmente.

foto: divulgação