Mais um ônus abusivo ao empregador brasileiro: a equiparação do acidente de trajeto ao acidente de trabalho
Antes da entrada em vigor da Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017), o artigo 58, §2º da CLT/1943 previa que o tempo despendido pelo empregado até o local de trabalho e para o seu retorno, por qualquer meio de transporte, não era computado na jornada de trabalho. A exceção a essa regra ocorria quando o empregador fornecia a condução ao empregado, nos casos em que a empresa estivesse em local de difícil acesso ou não servido por transporte público. Esse tempo gasto no transporte fornecido era chamado de horas in itinere e considerado como tempo à disposição do empregador. Mesmo essa exceção possuía aplicação limitada, pois os tribunais, em sua maioria, entendiam que locais estritamente urbanos não poderiam ser considerados de difícil acesso. Além disso, quanto ao transporte regular público, a jurisprudência entendia que a simples insuficiência não autorizava o deferimento das horas itinerantes. Entretanto, se houvesse real incompatibilidade de horários ou existisse transporte público em apenas parte do trajeto percorrido pelo empregado, era devido o pagamento das horas in itinere.
Nesse sentido, com as lacunas deixadas pela Reforma Trabalhista, a tendência deveria ser a de que não fosse configurado acidente de trabalho qualquer acidente de trajeto. Contudo, os tribunais do trabalho têm entendido em sentido contrário, ou seja, que o acidente de percurso, seja ele casa-trabalho ou trabalho-casa, equipara-se ao acidente de trabalho. O empregado faz jus à estabilidade acidentária, prevista pelo art. 118 da Lei 8.213/91, bem como aos depósitos do FGTS do período em que o contrato de trabalho ficar suspenso. Portanto, acidente de trajeto ainda se equipara a acidente de trabalho para fins previdenciários. Com isso, é ideal que as empresas mantenham a prática de emissão do documento denominado Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT), que é encaminhado para a Previdência Social, por meio do qual o funcionário obtém o auxílio-doença acidentário, sendo que a não emissão do documento pode sujeitar a empresa ao pagamento de multa ao Ministério do Trabalho. A interpretação dada pelos tribunais onera o empregador de forma inapropriada, sem fundamento legal expresso.
É importante esclarecer que, ao diferenciar as consequências legais do acidente de trajeto para fins previdenciários e para fins trabalhistas, a legislação apenas desafogaria o empregador sem desproteger o trabalhador. Isso, pois, por suposto, o acidente de trajeto capaz de afastar o empregado de suas atividades de trabalho ocasiona a proteção ao trabalhador com o recebimento de benefícios tais como auxílio-doença acidentário, auxílio-acidente, habilitação e reabilitação profissional. A melhor interpretação da lacuna da lei seria isentar o empregador da responsabilidade e dos ônus pela estabilidade acidentária e desembolso com o FGTS durante o período e a atual tendência de interpretação é um retrocesso, já que os acidentes no trajeto casa-trabalho podem ser inúmeros, por exemplo, em razão do tráfego intenso nas grandes cidades e das rodovias pouco seguras no interior. O empregador não tem qualquer controle sobre eles, portanto, não pode ser responsabilizado pelos acidentes ocorridos no trajeto.