A pandemia de coronavírus interrompeu o transplante e a captação de córnea várias vezes em 2020. Por isso, entre todos os tipos de transplantes foi o que sofreu a maior queda no Brasil. Um levantamento do oftalmologista Leôncio Queiroz Neto, presidente do Instituto Penido Burnier no banco de dados do DATASUS mostra que em Campinas e região metropolitana (RMC) o transplante de córnea caiu cerca de 70% de janeiro a setembro de 2020, bem mais que a redução de 56% em todo o País.
Por aqui, de 2019 para 2020, foram realizados entre janeiro e setembro, 51 e 15 transplantes respectivamente. No mesmo período os relatórios da Associação Brasileira de Transplante de Órgão (ABTO) revelam que em 2019 foram realizados no Brasil 10.997 transplantes de córnea, ante 4.807 em 2020.
Segundo Queiroz Neto a boa notícia é que de janeiro a setembro deste ano o número de transplantes de córnea praticamente dobrou em Campinas e RMC quando comparado ao mesmo período do ano passado De acordo com o DATASUS saltou de 15 para 29 cirurgias.
O especialista afirma que a má notícia é a demanda reprimida pela pandemia dos transplantes de córnea. Para ele, retornar ao número de captações e cirurgias de 2019 requer a manutenção da covid sob controle. Isso porque, além dos hospitais públicos se transformarem em covidários no caso de uma nova onda, um recente estudo publicado no JAMA, conceituado jornal da Associação Médica Americana, mostra que 55% das córneas de falecidos de covid-19 carregam partes do vírus e isso tem um efeito cascata na redução das captações.
Causa
O oftalmologista afirma que o ceratocone responde por 7 em cada 10 transplantes de córnea no Brasil. A estimativa do CBO (Conselho Brasileiro de Oftalmologia) do qual o médico faz parte, é de que 100 mil brasileiros tenham a doença. O ceratocone, explica, enfraquece e afina a córnea, lente externa do olho que vai tomando o formato de um cone conforme progride. Geralmente surge na infância e adolescência. “No início pode ser confundido com astigmatismo. Isso porque, logo que surge pode ser corrigido com óculos, geralmente coexiste com astigmatismo e as duas alterações refrativas têm vários sintomas em comum: visão desfocada para perto e longe, fotofobia, ofuscamento e visão embaçada”, salienta. A principal diferença é a troca mais frequente dos óculos no ceratocone, sobretudo entre crianças por conta da progressão mais acelerada durante a infância.
Os principais fatores de risco elencados pelo médico são:
Casos na família
- Ter alguma alergia
- Síndrome de Down
- Olho seco
- Hábito de coçar os olhos
- Apneia do sono
- Miopia e alta miopia
Diagnóstico
Queiroz Neto afirma que na mulher o ceratocone pode ser descoberto durante a gravidez. Não quer dizer que a gestação cause a doença. “Significa que a maior retenção de água causada pelas mudanças hormonais altera a refração e pode piorar bastante a visão de gestantes”, esclarece.
Por isso, para quem têm astigmatismo ou convive com algum fator de risco, o médico recomenda incluir no planejamento da gestação a tomografia da córnea. Isso porque, o exame avalia milhares de pontos das duas faces da córnea e pode flagrar o ceratocone bem no início “Já atendi pacientes que nem desconfiavam ter ceratocone e a tomografia permitiu o diagnóstico precoce”, afirma.
Tratamentos
O oftalmologista destaca que diversos estudos mostram que geralmente o ceratocone progride mais rápido até a idade de 25 anos. Hoje há tratamentos para impedir o transplante, mas devem seguir protocolos. Um deles é o crosslinking, único que interrompe a progressão do ceratocone em 90% dos casos. O especialista explica que o procedimento é ambulatorial e feito com anestesia local (colírio). Aumenta em até 3 vezes a resistência da reticulação da córnea. Consiste na aplicação de vitamina B2 (riboflavina) e luz ultravioleta na córnea. Em 3 dias as atividades podem ser retomadas. Queiroz Neto ressalta que o croslinking é contraindicado para córnea com espessura inferior a 400 micras, olhos com cicatrizes e outras alterações externas, portadores de glaucoma e histórico de herpes.
Outra terapia que pode evitar o transplante é o implante de anel intraestromal que aplana a córnea, deixa a lente mais estável no olho e melhora a visão. Para que tem muito desconforto no uso das lentes rígidas indicadas para corrigir o ceratocone a alternativa é a lente escleral que invés de ficar apoiada na córnea se apoia na esclera.
“Igual a todas as outras doenças, no ceratocone a prevenção continua sendo o melhor remédio, principalmente porque no transplante pode ocorrer rejeição”, conclui.
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